quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Banda: Blood, Sweat & Tears; Álbum: Blood, Sweat & Tears



Banda: Blood, Sweat & Tears
Álbum: Blood, Sweat & Tears
Ano: 1968
Gênero: Rock; Jazz Fusion; Soul; Blues

O Blood, Sweat & Tears é uma banda que toca música. Pode parecer uma incrível redundância, mas se pensarmos que temos bandas de rock, bandas de jazz, bandas de pagode, reggae etc, classificar de maneira tão generalizada o estilo de uma banda é algo que chama a atenção.

Formada em 1967 em Nova York, EUA, o Blood Sweat & Tears nasceu em meio a tudo de incrível que aconteceu nos anos 60 e parece ter assimilado um pouco de tudo no seu som. Tudo bem que isso parecia ser o padrão das bandas memoráveis que surgiram nessa época, mas algumas coisas diferenciam o BS&T (como costumam abreviar).

Primeiro, e é uma coisa que eu acho muito interessante, é a maneira como eles apresentam a mescla de rock e jazz dentro das músicas. Enquanto muitas bandas de jazz fusion - como a carreira do Miles Davis a partir do In A Silent Way ou o grande Herbie Hancock, por exemplo - focam muito mais nas improvisações e demonstração de virtuosismo, o BS&T trazia na maioria de suas músicas uma estrutura mais acessível, que bebia da fonte do rock e do blues.

O destaque dado pelo BS&T aos metais também merece ser diferenciado. Se aproxima muito do funk, com um quê de big band. E todos músicos assaz competentes, e isso merece ser dito.

O debut do BS&T foi o ótimo, porém mais experimental, Child Is The Father Of The Man, de 1968. Nessa altura, a banda contava com Randy Brecker (trompete e fliscorne), Bobby Colomby (bateria, percussão, voz), Jim Fielder (baixo, baixo fretless), Dick Halligan (trombone), Steve Katz (guitarra, alaúde), Al Kooper (órgão, piano, ondiolino, voz principal), Fred Lipsius (piano, saxofone alto) e finalmente Jerry Weiss (trompete, fliscorne e voz), além de vários outros músicos de estúdio. Talvez estes nomes não sejam muito conhecidos pelo grande público, mas bandas em que os músicos acima citados tocaram incluem o Mothers Of Invention (do grande Frank Zappa), Buffalo Springfield (do grande Neil Young), Bob Dylan e Jimi Hendrix (não preciso nem dizer o quão grandes estes são).

O disco foi um sucesso, mas a banda queria um vocalista mais forte que Al Kooper (que respondia como líder da banda). Sugeriram que ele ficasse exclusivamente no teclado, mas ele acabou saindo do grupo.

Vários nomes foram cogitados para substituir Kooper, entre eles Stephen Stills (Crosby, Stills & Nash) e Laura Nyro (sim, vocês já viram este nome por aqui), mas quem acabou ficando com a vaga foi o cantor anglo-canadense David Clayton-Thomas. A voz de Clayton-Thomas havia chamado a atenção de uma amiga do conjunto, a cantora Judy Collins, e ela convidou Katz e Colomby para vê-lo cantar em um bar em Nova York. Ele ganhou a vaga instantaneamente. Dick Halligan assumiu o órgão e o piano e dois novos membros entraram: Lew Soloff (trompete, fliscorne) e Chuck Winfield (trompete) entraram no lugar de Brecker e Weiss, que também saíram logo após o primeiro álbum.
E foi no meio dessa mudança de formação que nasceu o álbum aqui resenhado.

Blood, Sweat & Tears é o segundo álbum da banda e foi lançado no fim de 1968. A proposta foi fazer um álbum mais acessível que seu sucessor, e desta vez mesclava mais covers às composições dos integrantes. Além disso, é um dos primeiros álbuns da história a ser gravado em 16 canais, uma tecnologia que pouquíssimos estúdios da época podiam desfrutar.

O conjunto entrou no CBS Studio em Nova York no começo de Agosto de 1968 para gravar um álbum memorável.

Curiosamente, a abertura do álbum é completamente diferente de tudo o que descrevi até agora neste post. Variations On A Theme By Erik Satie (1st and 2nd Movements) é uma versão de uma composição instrumental de, como o nome sugere, Erik Satie, um pianista e compositor francês nascido do século XIX. Um movimento arriscadíssimo, pois a música é lenta e tristíssima por mais de um minuto, explodindo grandiosamente em seguida em uma orquestra desafiadora, lembrando a trilha sonora de alguma abertura de algum filme de guerra dos anos 20.

Mas é na segunda faixa, Smiling Phases, que o BS&T mostra a que realmente veio. É uma das melhores do disco. A voz rasgada e swingada de David Clayton-Thomas chama o ouvinte para dançar nesta belíssima faixa composta originalmente pelo Traffic. Os metais e os teclados dominam o arranjo, que recebeu uma roupagem completamente nova em todos os detalhes. O solo de piano de Halligan é arrebatador.

Sometimes In Winter é uma composição de Steve Katz, e ele mesmo canta esta belíssima faixa. Bem mais calma que a anterior, traz um belo arranjo de flauta (tocada por Halligan) e uma letra triste. Gosto muito do contraste entre o clímax da orquestra e a voz doce de Katz logo em seguida, lamentando: "Now you're gone, girl...". Belíssima.

A introdução de More and More poderia ter saído de uma música de James Brown. Os metais e a voz de negão de Clayton-Thomas formam um casamento perfeito. Bem nos moldes de Smiling Phases, com um refrão marcante e destaque para o entrosamento de Fielder e Colomby na cozinha.

Em seguida o BS&T faz um cover de And When I Die, de Laura Nyro (detalhe: composta quando a moça tinha 18 anos). A versão original já trazia muitas características compatíveis com o estilo do BS&T: metais, swing e execução impecável. Mas a versão da banda trouxe um novo tempero à música, mais jazz com um leve toque de bluegrass e o tempero de big band já característico. Uma belíssima interpretação, mais um destaque do álbum.

Falando em jazz, o álbum segue com uma belíssima releitura de God Bless The Child, da eterna Billie Holiday. Clayton-Thomas mostra sua versatilidade, transitando do jazz/rock ao soul com extrema facilidade. Temos até uma breve passagem por uma salsa/jazz, que inesperadamente retorna ao soul com a mesma naturalidade que desviou dele. Sensacional.

Spinning Wheel é uma composição de Clayton-Thomas e certamente uma das faixas mais rock and roll do álbum. O feeling da canção e a própria voz do cantor lembram Joe Cocker, com direito a um break de jazz e a incríveis variações no arranjo no decorrer da música. Começamos com rock e terminamos imaginando menestréis dançando na floresta.

You've Made Me So Very Happy é um R&B que havia sido lançado no ano anterior na voz de Brenda Holloway, mas acabou se tornando um dos maiores hits do álbum do BS&T. Novamente temos swing, metais e a performance impecável da banda. Interessante notar como o arranjo do Blood, Sweat & Tears enriqueceu a canção.

Blues - Part II é uma música de mais de 10 minutos (!) que traz referências a Sunshine Of Your Love, do Cream, e a Spoonful, do blueseiro Willie Dixon. Sei que estou ficando redundante, mas tudo é executado exatamente da maneira que deveria ser. É um banquete auditivo.
E quando menos se espera, o álbum reprisa a primeira faixa para anunciar seu fim.

É um álbum que fez muito sucesso em sua época, mas que as gerações mais novas (eu incluso) desconhecem. Esta pérola merece ser ouvida por todos.
Ah, e este disco ganhou o Grammy em 1969, desbancando nada mais, nada menos, que o lendário Abbey Road, dos Beatles.

Recomendadíssimo.

Tracklist:
  1. "Variations on a Theme By Erik Satie" (1st and 2nd Movements) – 2:35
  2. "Smiling Phases" (Steve WinwoodJim CapaldiChris Wood) – 5:11
  3. "Sometimes in Winter" (Steve Katz) – 3:09
  4. "More and More" (Vee Pee Smith, Don Juan) – 3:04
  5. "And When I Die" (Laura Nyro) – 4:06
  6. "God Bless the Child" (Billie HolidayArthur Herzog Jr.) – 5:55
  7. "Spinning Wheel" (David Clayton-Thomas) – 4:08
  8. "You've Made Me So Very Happy" (Berry Gordy Jr.Brenda HollowayPatrice HollowayFrank Wilson) – 4:19
  9. "Blues – Part II" (Blood, Sweat & Tears) – 11:44
  10. "Variations on a Theme By Erik Satie" (1st Movement) – 1:49